4.1 Mudança de variáveis - parte 1

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Considere-se uma aplicação

(1)
\begin{array} {rcl} \phi :\; D \subset \mathbb{R}^2 & \longrightarrow & A \subset \mathbb{R}^2 \\ (u,v) & \longmapsto & (x,y) \end{array}

continuamente diferenciável e bijectiva, onde $D$ e $A$ são regiões de integração e $D$ é também um domínio de parametrização. Seja

(2)
\begin{array} {rcl} i :\; \mathbb{R}^2 & \longrightarrow & \, \mathbb{R}^3 \\ (x,y) & \longmapsto & (x,y,0) \end{array}

a imersão canónica de $\mathbb{R}^2$ em $\mathbb{R}^3$. Então $r:= i \circ \phi$ é uma parametrização continuamente diferenciável e injectiva da superfície $A \times \{0\}$ que tem como área, de acordo com a definição dada na parte 5 da secção 3.2,

(3)
\begin{align} \int\!\!\!\int_D \big\| \frac{\partial r}{\partial u}(u,v) \times \frac{\partial r}{\partial v}(u,v) \big\| \, du \, dv . \end{align}

Ora, se suposermos também que $\frac{\partial r}{\partial u}(u,v) \times \frac{\partial r}{\partial v}(u,v) \not= 0$, de modo a que $r$ seja regular e, portanto, de acordo com a discussão na parte 6 da secção 3.2, o resultado em cima seja o mesmo para qualquer outra parametrização de $A \times \{0\}$ deste tipo, seria natural dizer-se que o valor comum é o valor da área da superfície plana $A \times \{0\}$. Como esta deverá ter a mesma área que $A$, então (3) deverá ser igual a

(4)
\begin{align} \int\!\!\!\int_A 1 \, dx\, dy. \end{align}

E, naturalmente, estaremos à espera que, pelo menos para funções reais $f$ contínuas em $A$, se verifique também a igualdade

(5)
\begin{align} \int\!\!\!\int_A f(x,y) \, dx \, dy = \int\!\!\!\int_D f(\phi(u,v)) \, \big\| \frac{\partial r}{\partial u}(u,v) \times \frac{\partial r}{\partial v}(u,v) \big\| \, du \, dv. \end{align}

Como

(6)
\begin{align} \frac{\partial r}{\partial u} \times \frac{\partial r}{\partial v} = \Big(0,0,\frac{\partial x}{\partial u}\frac{\partial y}{\partial v} - \frac{\partial y}{\partial u}\frac{\partial x}{\partial v}\Big) \quad \mbox{e, portanto,} \quad \| \frac{\partial r}{\partial u} \times \frac{\partial r}{\partial v} \| = |\det \phi'|, \end{align}

então não é de estranhar que o seguinte resultado, cuja prova omitimos, se verifique:

Proposição (mudança de variáveis na integração dupla)

Sejam $A \subset \mathbb{R}^2$ uma região de integração e $f : A \to \mathbb{R}$ uma função limitada cujo conjunto de pontos de descontinuidade tem conteúdo nulo. Seja $D \subset \mathbb{R}^2$ uma outra região de integração e $\phi : D \to A$ uma função continuamente diferenciável com as seguintes propriedades: existem abertos $D_1 \subset D$ e $A_1 \subset A$ tais que $\phi$ é bijectiva de $D_1$ para $A_1$, $\det \phi' \not=0$ em $D_1$ e $D \setminus D_1$, $A \setminus A_1$ têm conteúdo nulo. Então

(7)
\begin{align} \int\!\!\!\int_A f(x,y) \, dx \, dy \, = \, \int\!\!\!\int_D (f \circ \phi)(u,v) \, |\det \phi'(u,v)| \, du \, dv. \end{align}

Definição de jacobiano

O determinante $\det \phi'$ da matriz jacobiana de $\phi$, que aparece em (7), designa-se por determinante jacobiano (ou, simplesmente, jacobiano) de $\phi$. É também habitual denotá-lo por

(8)
\begin{align} \frac{\partial(x,y)}{\partial(u,v)}, \end{align}

onde aqui $x = x(u,v)$ e $y = y(u,v)$ desempenham os papéis de funções coordenadas de $\phi$.

Exemplo

No segundo exemplo da parte 4 da secção 2.2, calculámos o volume $V$ do sólido delimitado pelo elipsóide de equação

(9)
\begin{align} x^2+\frac{y^2}{4}+z^2=1 \end{align}

através do cálculo directo de

(10)
\begin{align} 8 \int\!\!\!\int_A \sqrt{1-x^2-\frac{y^2}{4}} \: dy \, dx, \end{align}

onde $A := \{ (x,y) \in \mathbb{R}^2 : x \geq 0,\, y \geq 0,\, x^2+\frac{y^2}{4} \leq 1 \}$. Uma alternativa mais simples seria fazer uma mudança de variáveis dada pela função continuamente diferenciável

(11)
\begin{align} \phi(r,\theta) := (r \cos \theta, 2 r \sin \theta), \end{align}

a qual transforma $D := [0,1] \times [0, \pi/2]$ em $A$, embora não injectivamente (observe que todos os pontos do segmento $\{ 0 \} \times [0, \pi/2] \in D$ são transformados no ponto $(0,0) \in A$. No entanto, $\phi$ transforma injectivamente ${\rm int}\, D$ em ${\rm int} A$ (os quais diferem, respectivamente, de $D$ e de $A$ apenas por subconjuntos de conteúdo nulo), verificando-se ainda que

(12)
\begin{align} \frac{\partial(x,y)}{\partial(r,\theta)} = 2r, \end{align}

que é diferente de zero em ${\rm int}\, D$. Assim, de acordo com a fórmula (7), o cálculo do volume em causa pode prosseguir do seguinte modo:

(13)
\begin{eqnarray} V & = & 8 \int\!\!\!\int_D \sqrt{1-r^2 \cos^2 \theta -\frac{4 r^2 \sin^2 \theta}{4}} \: |2 r| \, dr \, d \theta \\ & = & 8 \int_0^{\pi/2} \int_0^1 \sqrt{1-r^2}\: 2r \, dr \, d \theta \\ & = & 4 \pi \Big[ -\frac{2}{3}(1-r^2)^{3/2} \Big]_0^1 \; = \; \frac{8}{3}\, \pi. \end{eqnarray}

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