3.2 Superfícies e seus integrais - parte 5

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Nos termos do exercício anterior, conjugando com a discussão feita na parte 2 da secção 3.1, sobre a possibilidade de o gráfico de uma função $f(x,y)$ se poder aproximar, junto a $(x_0,y_0,f(x_0,y_0))$, pelo plano tangente ao gráfico nesse ponto (garantida a diferenciabilidade de $f$ em $(x_0,y_0)$), a área do paralelogramo de lados

(1)
\begin{align} \Delta x \, \frac{\partial r}{\partial x}(x_0,y_0) \quad \mbox{e} \quad \Delta y \, \frac{\partial r}{\partial y}(x_0,y_0), \end{align}

para diferenças pequenas $\Delta x := x-x_0$ e $\Delta y := y-y_0$, deverá ser uma boa aproximação para a área da porção de superfície correspondente ao rectângulo $[x_0,x] \times [y_0,y]$ no domínio $D$ da função. Assim, no caso de $f$ ser diferenciável no seu domínio, fazendo uma partição neste através de pequenos rectângulos1, e adicionando todos aquelas áreas dos pequenos paralelogramos, deveremos obter uma aproximação para a área total da superfície. Devendo também tal aproximação melhorar à medida que se vão considerando partições de $D$ com rectângulos cada vez mais pequenos.

Observe-se também que, como se sabe da geometria analítica, a área do paralelogramo de lados indicados em (1) é, para diferenças positivas, dada por

(2)
\begin{align} \big\| \Delta x \, \frac{\partial r}{\partial x}(x_0,y_0) \times \Delta y \, \frac{\partial r}{\partial y}(x_0,y_0) \big\|, \quad \mbox{ou seja}, \quad \big\| \frac{\partial r}{\partial x}(x_0,y_0) \times \frac{\partial r}{\partial y}(x_0,y_0) \big\| \, \Delta x \, \Delta y. \end{align}

Esta construção faz lembrar a construção do integral duplo, de modo que é tentador dizer que a área da superfície é dada por

(3)
\begin{align} \int\!\!\!\int_D \big\| \frac{\partial r}{\partial x}(x,y) \times \frac{\partial r}{\partial y}(x,y) \big\| \, dx \, dy. \end{align}

A juntar a isto há o facto de uma comparação com a caracterização do comprimento de arco através de integrais, dada na secção 1.2, permitir verificar que tal integral também se pode obter empiricamente por um processo análogo ao que usámos em cima, aproximando pequenas porções de curva por porções correspondentes de rectas tangentes.

Assim, extrapolando, o nosso ponto de vista será o de definir área de superfície parametrizada usando uma expressão como (3). Precisamos, no entanto, primeiro de resolver duas questões técnicas. A primeira delas tem a ver com o facto de, na prática, termos algumas limitações acerca dos subconjuntos de $\mathbb{R}^2$ sobre os quais sabemos integrar. A seguinte definição não deve causar estranheza, se a compararmos com a aditividade do integral.

Definição de região de integração

Um subconjunto de $\mathbb{R}^2$ diz-se uma região de integração se for uma união finita de subconjuntos de tipo I ou de tipo II (podendo tipos diferentes coexistir) cujos interiores sejam disjuntos dois a dois.

A segunda questão técnica tem a ver com o facto de só termos definido diferenciabilidade de funções em pontos interiores.

Definição de função continuamente diferenciável num fechado

Seja $D$ um subconjunto fechado de $\mathbb{R}^n$. Diz-se que uma função $g : D \to \mathbb{R}^m$ é continuamente diferenciável se existir uma extensão $\tilde{g}$ de $g$ a um aberto $U \supset D$ tal que $\tilde{g}$ é continuamente diferenciável (i.e., as suas derivadas parciais são contínuas) em $U$.

Observe-se que uma região de integração é um conjunto fechado (e limitado).

Definição de área de superfície parametrizada

Seja $D \subset \mathbb{R}^2$ um domínio de parametrização que é também uma região de integração. Seja $r : D \to \mathbb{R}^3$ uma superfície parametrizada continuamente diferenciável. Define-se a área de $r$ por

(4)
\begin{align} \int\!\!\!\int_D \big\| \frac{\partial r}{\partial u}(u,v) \times \frac{\partial r}{\partial v}(u,v) \big\| \, du \, dv. \end{align}

Podemos verificar que esta fórmula dá o resultado esperado no seguinte exemplo não trivial:

Exemplo

Pelo mesmo tipo de argumento usado na discussão feita a seguir à introdução do sistema de coordenadas esféricas,

(5)
\begin{align} r(\theta,\varphi)=(\cos \theta \, \sin \varphi, \sin \theta \, \sin \varphi, \cos \varphi), \quad \theta \in [0,2\pi], \, \varphi \in [0,\pi] \end{align}

define uma parametrização da esfera de centro na origem e raio 1. Como

(6)
\begin{align} \frac{\partial r}{\partial \theta} \times \frac{\partial r}{\partial \varphi} = (-\cos \theta \, \sin^2 \varphi, -\sin \theta \, \sin^2 \varphi, -\sin \varphi \, \cos \varphi), \end{align}

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(7)
\begin{align} \big\| \frac{\partial r}{\partial \theta} \times \frac{\partial r}{\partial \varphi} \big\| = \sin \varphi, \end{align}

então a área de $r$ é, de acordo com a definição feita atrás,

(8)
\begin{align} \int_0^{2\pi} \int_0^\pi \sin \varphi \, d \varphi \, d \theta = 4 \pi, \end{align}

que é também o conhecido valor para a área da esfera em causa.

Observe, no entanto, como seria muito fácil obter um valor diferente para a área de uma outra parametrização da superfície em causa. Verifique, por exemplo, o que obteria se fosse permitido ao parâmetro $\theta$ variar entre 0 e $3 \pi$, o que o deve alertar para alguma precaução a tomar quando pretender calcular a área da superfície imagem de uma superfície parametrizada.


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