2.3 Integrais curvilíneos - parte 2

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Existe uma outra noção de integral ao longo de um caminho que tem interesse físico. Começaremos por dar a definição matemática e referir-nos-emos logo a seguir ao conceito físico em causa.

Definição de integral de linha de campos vectoriais

Seja $r : [a,b] \to \mathbb{R}^n$ um caminho seccionalmente suave. Seja $f : r([a,b]) \to \mathbb{R}^n$ tal que $f \circ r$ é seccionalmente contínua. O integral de linha (ou curvilíneo) de $f$ ao longo de $r$ define-se como

(1)
\begin{align} \int_r f \cdot dr := \int_a^b f(r(t)) \cdot r'(t) \, dt. \end{align}

O ponto entre $f(r(t))$ e $r'(t)$ no membro direito em cima indica produto interno destes dois vectores; o seu uso no membro esquerdo faz parte da notação do integral que está aí a ser definido.

Uma função como o $f$ em cima (com domínio e valores em $\mathbb{R}^n$) também se designa por campo vectorial, o que justifica o título usado na definição.

Em Física, o integral de linha acabado de definir é usado para calcular o trabalho realizado por uma força $f$ ao deslocar uma partícula ao longo da curva imagem do caminho $r$, desde o ponto $r(a)$ até ao ponto $r(b)$.

No caso de uma força constante $f$ exercida sobre uma partícula que se desloque ao longo de um segmento de recta em $\mathbb{R}^3$, desde um ponto $A$ até um ponto $B$, se usarmos a parametrização $r$ dada por

(2)
\begin{align} r(t) = (1-t)A + tB, \quad t \in [0,1], \end{align}

obtém-se para o respectivo trabalho a expressão $\int_0^1 f \cdot (-A+B) \, dt$, isto é, $f \cdot (B-A)$.

Sendo ambos os integrais curvilíneos definidos à custa de integrais simples de Riemann, muitas propriedades para estes passam para aqueles. Por exemplo, é imediato que são ambos lineares, e que são ambos aditivos (em relação ao caminho de integração). Mais precisamente, e no que diz respeito à aditividade, tem-se que, dados $r$ e $f$ nas condições das definições, e dado $c \in ]a,b[$,

(3)
\begin{align} \int_r f \, ds = \int_{r|_{[a,c]}} f \, ds + \int_{r|_{[c,b]}} f \, ds \quad \mbox{ e } \quad \int_r f \cdot dr = \int_{r|_{[a,c]}} f \cdot dr + \int_{r|_{[c,b]}} f \cdot dr. \end{align}

Em certas aplicações geométricas ou físicas, como nos casos do cálculo do comprimento de uma curva ou do cálculo da massa de um filamento que ocupa o espaço definido por uma curva, poderá ser importante garantir que os resultados são (ou que podem não ser) independentes da parametrização a usar nos cálculos. Não trataremos aqui este assunto completamente, o qual exigiria, pelo menos em primeira instância, a restrição ao universo das curvas suaves, isto é, das curvas que admitem parametrizações injectivas (excepto porventura nos extremos) e suaves $r$ tais que $r' \not= 0$ em todos os pontos do intervalo de parametrização. E a consideração somente de parametrizações com estas propriedades.

Num tal caso seria, em particular, possível garantir a existência de (somente) duas orientações contrárias na curva (suave), assim como seria possível provar que para o cálculo do integral relativamente ao comprimento de arco é indiferente a parametrização que se considera, desde que obedeça às restrições indicadas, enquanto que para o integral de linha de campos vectoriais há dois valores possíveis, consoante a orientação que se considera.

Designando por $C$ a curva imagem de $r$ numa tal situação, pode escrever-se, sem ambiguidade, $\int_C f \, ds$ em vez de $\int_r f \, ds$. E, se for clara a orientação a considerar, pode escrever-se, sem ambiguidade, $\int_C f \cdot dr$ em vez de $\int_r f \cdot dr$ — que, no caso de $C$ ser também uma curva fechada (i.e., com os extremos inicial e final coincidentes), se diz também a circulação de $f$ ao longo de $C$ (no sentido prescrito).

O resultado que se segue é uma versão ligeira deste tipo de conclusões. Precisamos, no entanto, de uma definição prévia.

Definição de reparametrização

Seja $r : [a,b] \to \mathbb{R}^n$ um caminho. Seja $u: [c,d] \to [a,b]$ uma aplicação bijectiva e continuamente diferenciável. Diz-se que $p:= r \circ u : [c,d] \to \mathbb{R}^n$ é uma reparametrização de $r$.

Observe-se que o $p$ em cima considerado é também um caminho e que a sua curva imagem coincide com a de $r$. Além disso, $u$ terá ou que ser crescente ou que ser decrescente, logo ter-se-á, respectivamente, $p(c)=r(a)$ e $p(d)=r(b)$, ou $p(c)=r(b)$ e $p(d)=r(a)$. No primeiro caso dir-se-á que $p$ mantém o sentido de $r$; no segundo caso dir-se-á que $p$ inverte o sentido de $r$.

Proposição (sobre reparametrizações em integrais curvilíneos)

Seja $r : [a,b] \to \mathbb{R}^n$ um caminho seccionalmente suave. Seja $f$ uma função definida em $r([a,b])$ e tal que $f \circ r$ é seccionalmente contínua. Seja $p:= r \circ u$ uma reparametrização de $r$.

Se $f$ for um campo escalar, então

(4)
\begin{align} \int_p f \, ds = \int_r f \, ds. \end{align}

Se $f$ for um campo vectorial, então

(5)
\begin{align} \int_p f \cdot dp = \int_r f \cdot dr \quad \mbox{no caso de }\, p \, \mbox{ manter o sentido de }\, r; \end{align}
(6)
\begin{align} \int_p f \cdot dp = - \int_r f \cdot dr \quad \mbox{no caso de }\, p \, \mbox{ inverter o sentido de }\, r. \end{align}

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